terça-feira, 11 de agosto de 2015

Um caso Aparte

(por Cleiton Evandro dos Santos - Ass: Aparte da Canção Nativa)
Jaime Brum Carlos recebe o troféu pelo primeiro lugar no 1º Aparte, por Eterna Ausência
Crédito: Museu Municipal

Jaime Brum Carlos, vencedor do I Aparte da Canção Nativa, comemora a volta do festival e do campeirismo a Cachoeira do Sul
Quando naquela noite de março de 1989 a voz potente do cantor Léo Almeida ecoou pelo ginásio Arrozão com o refrão: “Sempre que um laço assovir no espaço, num sobrelombo de virar por cima, rebrotará por entre a polvadeira a estampa guapa do Negro Lima”, não houve quem não arrepiasse, e alguns dos presentes foram as lágrimas. A milonga Eterna Ausência, com letra do cachoeirense Jaime Brum Carlos e melodia de Sabani Felipe de Souza, foi aplaudida de pé por grande parte das 3 mil pessoas que estavam no Ginásio da Fenarroz. Era uma homenagem ao pecuarista e advogado Edson Fernando Ferreira Lima, perpetuado então como Negro Lima, filho do também muito conhecido advogado e pecuarista Edyr Lima, patrono do Museu Municipal.
Edson, que era suplente de vereador – exercendo a titularidade - havia falecido em 24 de novembro de 1987, aos 40 anos, em um trágico acidente de trânsito. Deixou uma ferida aberta no meio tradicionalista e agropecuário de Cachoeira. Jaime Brum Carlos, médico veterinário hoje radicado em Restinga Seca, era amigo muito próximo do “Negro Lima”. Logo após a premiação, subiram ao palco com os autores, dois filhos de Edson. Fernando, o “Cabeça”, e Flávio, o “Pingo”, ambos citados na música. Os outros três filhos eram ainda muito jovens: Fabrício, do Escritório Rural Centauro e que recentemente foi patrão do CTG José Bonifácio Gomes, Edyr Lima Neto, e Raul Lima, ginete multipremiado no Freio de Ouro.

O “NEGO LIMA”
Edson Fernando Ferreira Lima monta Frevo do Angico, no desfile da Semana Farroupilha
Crédito: Arquivo da família
Edson Fernando Ferreira Lima era pessoa muito querida nos meios tradicionalistas e agropecuário de Cachoeira do Sul e região, tendo atuado no Sindicato Rural, em diretorias do CTG José Bonifácio Gomes e diversas atividades relacionadas ao campo, a ponto de ter sido eleito suplente de vereador entre 1985 e 1988. Ele assumiu a titularidade do mandato por um ano, concluído justamente pelo fatídico acidente.
Na Vila Piquirí, interior do município, o galpão crioulo da escola leva seu nome. No Parque Xangri-lá, há uma rua que o homenageia, e a pista de laço do Sindicato Rural de Cachoeira do Sul também o tem como patrono, tamanha sua importância e representatividade para a entidade. Seus filhos, familiares e amigos também criaram o Piquete de Tradições Gaúchas Edson Fernando Ferreira Lima, que participou de inúmeros rodeios e atividades regionais.

A VITÓRIA
Jaime Brum Carlos e Sabani Felipe de Souza, compositores de Eterna Ausência
A vitória no Aparte foi um misto de alegria e tristeza. Alegria por estar prestando uma homenagem a um grande amigo e um grande homem, um campeiro como poucos que conheci. E, ao mesmo tempo, a tristeza de sua eterna ausência”, explica Jaime Brum Carlos. Aliás, Eterna Ausência tornou-se um clássico da música nativista e até hoje, 25 anos depois, roda nos programas nativistas de rádio Rio Grande afora.
Para Brum Carlos, a volta do Aparte é simplesmente o resgate de um evento que, na época, trouxe de volta a verdadeira cultura campeira pra os palcos de Cachoeira, visto que a Vigilia havia se extraviado das suas próprias raízes e se tornado um festival de música mais urbana. Segundo ele, após o Aparte, a Vigilia retornou aos trilhos, o que fez com que o Aparte se tornasse desnecessário, pois já havia cumprido com a sua missão.
Agora, com a lacuna deixada novamente pela ausência da Vigilia, o Aparte retorna para reerguer a bandeira da cultura nativa. Espero que, desta vez, seja para sempre, pois Cachoeira tem plenas condições de promover dois eventos - um na Feira Agropecuária de Cachoeira do Sul (Feapec) e outro na Feira Nacional do Arroz (Fenarroz). Aliás, o Aparte tem "a cara" da Feapec, pois ambos são eventos voltados ao homem que tem raízes no campo, não importando onde viva”, destaca o compositor.
Fernando Lima, filho de Edson, destaca também a importância da volta do Aparte. “O Aparte já era importante pelo seu perfil de festival campeiro, ligado às nossas orígens lá no Piquirí, ao CTG José Bonifácio Gomes, ao Sindicato Rural. Nossas casas também. Mas, quando Eterna Ausência venceu o festival, numa homenagem ao nosso pai, gravou em nossa alma a sua importância, tornou-se parte da família e estamos muito felizes com sua volta”, enfatiza.

NO PÁREO
Os vencedores 1º Aparte da Canção Nativa, Jaime Brum Carlos e Sabani Felipe de Souza confirmaram esta semana que inscreveram novas canções inéditas no festival. E aguardam a triagem para ver se estarão novamente no palco. “Estamos torcendo muito, mas temos certeza de que há muitas músicas de altíssimo nível inscritas e a peleia não será fácil, nem o papel dos jurados em escolher 12 composições entre mais ou menos umas 500”, assegura Jaime.

ETERNA AUSÊNCIA
L: Jaime Brum Carlos
M: Sabani Felipe de Souza
Ritmo: Milonga
Intérprete: Léo Almeida

Boleou a perna sem pedir licença
no rancho grande da eternidade.
Quem viveu sempre a semear o bem
deixa os amigos a colher saudade.
Esta ausência que se faz presente
pelos rodeios e nas marcações,
faz imortal a sua alma-pampa
nas almas xucras dos outros peões!

SEMPRE QUE UM LAÇO ASSOVIAR NO ESPAÇO
NUM SOBRE-LOMBO DE VIRAR POR CIMA
REBROTARÁ POR ENTRE A POLVADEIRA
A ESTAMPA GUAPA DO NEGRO LIMA.

Quem lhe seguiu o rastro, vida a fora
viu na sua morte o que um amigo vê :
o inconformismo a contrair-lhe o peito
E um grito preso a indagar: Por quê ?...

Até o seu pingo que seguiu o corpo
sentindo que não lhe veria mais,
cabeça erguida relinchava triste
como a dizer que descansasse em paz.

O campo santo onde repousa o corpo
é o berço, apenas , guardando a matéria,
pois seu espírito rumbeia os campos
na andança eterna da vida gaudéria.

Ele está entre os que nunca morrem,
porque nasceram para serem eternos,
pois os seus nomes ficam perpetuados
pelos seus atos que eram flor e cerno.

Sempre que um laço...

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